DUNGA E LIDERANÇA

....
Em um comercial recente da sua linha de picapes, a GM anunciava que Dunga era “respeitado por sua força” e “temido por sua liderança”. Parêntese: talvez haja aí uma pequena confusão. No modo como o mundo corporativo brasileiro vê Dunga e, talvez, bem mais grave, no modo como concebe a liderança. Líderes não são temidos — são respeitados. E o respeito de que gozam não é angariado através do exercício da força ou do medo. Até porque as pessoas nutrem ojeriza, e não respeito, por aquilo que temem, por aquilo que lhes é enfiado goela abaixo.

Contrapostos aos líderes aparecem os chefes. Vários deles, sim, para gerir, lançam mão da coerção, do uso da hierarquia como lâmina. São chefes e impõem-se pela chibata exatamente porque não são líderes. E não são porque não dispõem dos instrumentos que permitem aos líderes ascender em um grupo sem sequer desmanchar o penteado.
“Eu sou um sujeito nervoso por natureza. E muitas vezes, durante uma partida, não dá para escolher o jeito de falar com as pessoas. Mas eu acho também que as coisas têm que ser faladas na hora. Há certas situações que precisam ser resolvidas no ato. Deixar para depois não adianta. O líder precisa ter a coragem de enfrentar essas situações de frente, mesmo tendo, muitas vezes, que pedir desculpas depois.”

Pergunto a Dunga que outras características formam um bom líder. “Um capitão tem que ser honesto com os outros e consigo mesmo, acima de tudo. Tem que ter sensibilidade para criticar sem abalar a auto-estima de um companheiro. O capitão também jamais pode ser desleal. Tem que tratar corretamente as pessoas, ser sempre o mesmo, dar exemplo e servir de referência para o grupo. No fim, o que faz de alguém um capitão é a sua forma de agir, a coerência de suas atitudes. Além disso, o capitão tem que estar sempre disponível e pronto para ajudar. Ele tem que saber que só terá sucesso se o grupo também for bem-sucedido.”

De fato, não existe líder que vai bem enquanto seu grupo vai mal. Quem conseguir estabelecer tal proeza não é um líder. Pode ser um profissional versado na arte de tirar o seu da reta, pode ser um sujeito que não está disposto a correr o risco de atrelar seu futuro ao do time, pode ser um arrivista. Qualquer coisa. Não é um líder.
Dunga aponta outra característica fundamental do líder: a capacidade de abdicar dos próprios desejos e convicções em nome de um objetivo maior, que aglutine o grupo. “Há muitas formas diferentes de pensar dentro de uma equipe. A função do capitão é unir todos em torno de um objetivo comum, definir uma linha de trabalho com a participação de todos e batalhar para que ninguém se afaste dela.”

O líder precisa saber ouvir. “Muitas vezes o capitão precisa mais escutar do que falar. A gente sempre tem coisas a aprender, não importa o quanto já saiba, nem com quem esteja falando. O jogador de futebol, eu inclusive, é um sujeito vaidoso. A diferença é que o vaidoso inteligente sabe ouvir, reconhecer as críticas. O vaidoso burro não ouve nada, não ouve ninguém. Mas esses costumam não ir muito longe.”

Além de ouvir, o líder precisa também — óbvio — dominar a arte de dizer as coisas certas na hora certa. Precisa ter a capacidade de convencer, de gerar consenso. O que dizer ao time no vestiário após uma derrota acachapante, em que nada deu certo? “O capitão tem que falar dos problemas quando o time está ganhando. Porque é mais fácil para as pessoas absorver a crítica nessa situação. Na derrota, a hora é de jogar o astral para cima, de trabalhar a auto-estima do grupo. A crítica no momento de fracasso não faz sentido porque as pessoas já estão angustiadas o suficiente. Elas tendem a se defender: ou se recolhem ou contra-atacam.”

Por fim, Dunga fala de determinação, de perserverança e de disciplina como pré-requisitos de um líder e de um grupo vencedores. “Disciplina não é só cumprir horário e cortar o cabelo. Disciplina é cada um se esforçar ao máximo para fazer o que sabe da melhor maneira possível. Um grupo vencedor tem que instituir o controle de qualidade do seu trabalho para atingir o acerto máximo e o erro mínimo. Fomos muito criticados na Copa de 94 por sermos organizados. É como se, para jogar bonito, fosse preciso ser irresponsável. Claro que a organização, para os brasileiros, não pode deixar a alegria de lado. Só porque tem alguém sorrindo não quer dizer que não se esteja trabalhando com seriedade. Um bom capitão tem que saber de tudo isso.”
“Um capitão só tem sucesso quando o grupo que lidera também for bem-sucedido”
Por Adriano Silva

Nenhum comentário:

Postar um comentário

MAIS SOBRE O PIX DO BANCO CENTRAL